Minha mãe costumava dizer que a curiosidade matou o gato. Na minha inocência de criança, ficava apavorado: coitado do gatinho, onde ele foi se meter para merecer isso? Foi atropelado por um carro por querer saber o que havia do lado oposto da rua? Ou talvez se engasgou com um osso de galinha tentando bisbilhotar no lixo? Será que o mesmo aconteceria comigo se eu tentasse pegar um pouco de brigadeiro da panela que minha mãe ainda não tinha retirado do fogo? A causa, nunca soube ao certo, mas o mistério era o que tornava a frase tão arrepiante: o bichano pagou coma própria vida, seu mais precioso bem, o preço de meter o nariz onde não foi chamado.
É interessante que, na virgindade da alma de uma criança, reza a mais pura humanidade. Somos curiosos por natureza, inclusive nos menores e mais singelos detalhes do nosso cotidiano, como abrir uma revista de fofocas, ou até mesmo querer saber como estará o tempo no próximo final de semana, para tomarmos a decisão certa de viajar ou não para a casa de praia. A necessidade de compreender o mundo ao nosso redor caminha conosco junto com o caminhar das civilizações, desde o berço da sociedade. Buscar entender o nosso meio é o modo que o ser humano encontrou de entender a si próprio.
O diferente, o novo, o incerto foram os pontos de partida para a criação de mitologias, religiões dos mais diversos povos, de todos os cantos do planeta Terra. Tentar explicar os raios nas tempestades, a causa de doenças e pragas, ou qualquer mistério que foge do nosso controle inspirou (e ainda inspira) as maiores histórias produzidas durante nossa existência. É o cerne da natureza humana: o que está fora de nossas mãos avançou além da nossa zona de conforto e somos fadados a sempre querermos retornar à ela. Sim, exatamente, o misterioso é desconfortável. O misterioso nos instiga, nos faz questionar. Afinal, o que há no topo daquele monte na Grécia? O que há de tão mágico no fruto daquela árvore que nos foi proibido de comer?
É a habilidade de questionar, única entre os seres do planeta, que consiste no núcleo de nossa humanidade. A ciência nasce da nossa sede por explicações, por buscarmos essa compreensão, porém de maneira sistemática, experimental com base em repetições e observações, invariante de pessoa para pessoa, criando verdades universais. O mais curioso de tudo, no entanto, é percebermos que o ponto de partida de uma pesquisa científica é uma hipótese. Em outras palavres, é a partir de uma ideia que queremos testar que começa todo o trabalho de um pesquisador. Algo muitas vezes abstrato. A ciência e a ficção, que frequentemente são colocadas em faces opostas de uma moeda são, em essência, a mesma coisa. Enquanto as histórias nos dão a liberdade para transcendermos os limites do mundo que conhecemos, a ciência nos mantêm firmes ao chão, onde acontece a vida real. Ambas se complementam, suprindo a carência que temos por desvendar o misterioso: nossa curiosidade. Limitar-se a uma delas em detrimento da outra é limitar a capacidade humana. E algo que não conhecemos são nossos limites, principalmente os limites dos nossos sonhos!
Foi com a cabeça nas nuvens que superei a morte do gatinho, imaginando que, onde ele estivesse, estaria brincando com seus amigos, feliz e se divertindo, enrolado em novelos de lã fofinhos e coloridos. Mas foi com base em um experimento científico que eu descobri que o brigadeiro pode ser muito mais prazeroso quando esperamos ele esfriar um pouco entes de comer. Se hoje conseguimos acender uma lâmpada foi porque, em algum momento no passado, a mesma lâmpada se acendeu na imaginação de um grande cientista.
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